As afecções relacionadas ao sistema urinário têm alta prevalência em cães e gatos, sendo apresentada de diversas formas como insuficiência renal aguda e crônica, defeitos tubulares, obstruções urinárias, urolitíases e infecções. A urinálise é considerada um exame de primeira linha por fornecer informações importantes para diagnóstico e acompanhamento terapêutico do animal, levando ao diagnóstico precoce dessas afecções e a uma melhor sobrevida. A urinálise é um exame laboratorial simples, não invasivo e de baixo custo, por isso é mais seguro e prático. Isso implica na sua utilização como um dos primeiros exames complementares a serem solicitados, juntamente com o hemograma, servindo como exame de triagem e check-up. Deve-se avaliar seu valor juntamente com a avaliação bioquímica, histórico e estado clínico geral do paciente.

É importante salientar:

O cuidado com o armazenamento: a amostra apresenta alta sensibilidade à temperatura ambiente, devendo ser analisada no máximo 2 horas após coleta caso não seja refrigerada. Após 30 minutos em temperatura ambiente ocorre multiplicação de bactérias e, caso sejam redutoras de ureia, irão alcalinizar a amostra. A urina alcalina tende a dissolver os cilindros e ocasionar a cristalização dos solutos, alterando pH e o aspecto macro e microscópico da urina. Outra alteração que ocorre é devida ação da luz ambiental, que pode degradar certos constituintes da urina (como bilirrubina e urobilinogênio) em menos de 1h, interferindo em suas análises, por isso frascos escuros são preferíveis para acondicionamento da amostra.

Informar ao laboratório o método de coleta: dependendo da coleta (micção natural, cateterismo ou cistocentese), há variação na interpretação dos resultados. A cistocentese é a técnica mais adequada para animais de pequeno porte, pois é coletada de forma estéril, portanto não há contaminação bacteriana, sendo ideal para cultura e antibiograma.

A urinálise pode ser dividida em 3 partes: exame físico, químico e análise do sedimento.

 

Exame físico na urinálise

Na urinálise o exame físico consiste na análise visual e macroscópica. Avalia-se aspecto ou turbidez, cor, densidade, odor e volume.

Aspecto: a urina normal é límpida, transparente. O aspecto pode ser influenciado pela concentração urinária. A variação na turbidez ocorre quando há presença de partículas suspensas na urina, como bactérias, hemácias e leucócitos, células epiteliais, cristalúria, por exemplo.

Cor: depende da concentração de urocromos, varia de acordo com a patologia existente no animal e deve sempre ser associada à densidade e volume urinário. A urina é tipicamente amarela e transparente e a excreção de alguns compostos, endógenos ou exógenos, pode levar à alteração de sua coloração. Causas de alteração: bilirrubinúria, febre, hematúria, hemoglobinúria e mioglobinúria, desidratação, nefrite aguda ou nefrose tóxica.

Densidade: retrata o grau de reabsorção tubular ou da concentração renal, sendo um indicador muito útil da habilidade de concentração urinária renal, pois a perda dessa habilidade costuma ser o primeiro sinal de doença tubular renal. Influenciada por: peso corporal, dieta, exercício, idade, grau de hidratação, condições climáticas e metabolismo do paciente. Deve ser interpretada junto ao grau de hidratação e ingestão hídrica do animal, para eliminar a possibilidade de falha renal como causa de desidratação.

hipostenúrica:  Sugere que não há falência renal, pois indica capacidade de filtração do filtrado glomerular. Porém rins podem não concentrar a urina por estarem refratários ao ADH ou ADH não é produzido de forma eficiente. Causas: patologias renais, diabetes insipidus.

Isostenúrica:  A osmolalidade urinária é igual a plasmática, indicando que os rins não alteram a concentração do filtrado glomerular ou que foi concentrada, mas não o suficiente para determinar função glomerular adequada. Pode ser sugestivo de falha renal primária.

Odor: odor fisiológico da urina é caracterizado como sui generis, variando entre espécies. O odor normal da urina é conferido pela presença de ácidos orgânicos voláteis. A urina normal dos herbívoros tem um odor aromático, enquanto nos carnívoros é picante e aliáceo. Exemplos: pútrido, adocicado, amoniacal.

Volume: é inversamente proporcional à densidade urinária específica. Varia de acordo com espécie, fluidoterapia, temperatura ambiente, umidade relativa do ar, atividade, ingestão de medicamentos e doenças que interferem na manutenção hídrica. O volume é a quantidade recebida pelo laboratório, sendo 10mL o mínimo adequado para análises.

 

Exame químico na urinálise

Na urinálise o exame químico detecta e mensura a concentração de várias substâncias na urina através da utilização de tiras reagentes urinárias, constituindo um método semi quantitativo e qualitativo de monitoramento.

Bilirrubina: deve ser avaliada associada à densidade urinária. Fisiologicamente, a urina não apresenta bilirrubina. Causas: distúrbios hepáticos ou hemolíticos e a obstrução das vias biliares com colestase.

Corpos cetônicos: a urina fisiológica é livre de corpos cetônico. A cetonúria ocorre quando estes compostos aumentam no plasma em decorrência de distúrbios no metabolismo de carboidratos e ácidos graxos. Causas: jejum prolongado, anorexia, lipidose hepática, hepatopatias e febre.

Glicose: em condições fisiológicas normais é reabsorvida nos túbulos proximais, não devendo aparecer na urina. A glicosúria ocorre quando a glicemia excede a capacidade de reabsorção renal Causas: hiperglicemia, lesão de túbulo proximal. A glicosúria pode ser de origem renal ou extra renal.

Glicosúria renal: ocorre acompanhada de densidade baixa. Característico de lesão renal e azotemia, enquanto a glicemia permanece dentro de valores fisiológicos.

Glicosúria extra renal: quando a glicose ultrapassa o limiar renal. Causas: nefropatias congênitas ou hereditárias, diabetes mellitus, hiperglicemia de jejum persistente, ingestão excessiva de açucares, pancreatite necrótica aguda, tratamento parenteral com glicose e frutose, hiperadrenocorticismo.

pH: o pH urinário não reflete necessariamente o sanguíneo e pode ser influenciado pela dieta, alimentação recente, infecção bacteriana e tempo de armazenamento.

Causas de urina ácida: febre, jejum, diabetes mellitus, insuficiência renal, dieta hiperproteica, acidose metabólica ou respiratória, hipocalcemia (aumenta reabsorção renal de K⁺ e eleva excreção do H⁺), alcalose metabólica em animais com hipocloremia devido ao vômito (leva à perda de HCl e K⁺, fazendo com que o Na⁺ seja reabsorvido com bicarbonato), administração de acidificantes.

Causas de urina alcalina: atraso no processamento e má conservação da amostra, cistite associada a bactérias produtoras de urease (Staphylococcus sp. e Proteus sp.), dietas alcalinas, administração de alcalinizantes, alcalose metabólica ou respiratória (reduzem excreção do H⁺), retenção urinária vesical.

Proteínas: em condições fisiológicas, as proteínas são mantidas no sangue durante a filtração glomerular e reabsorção tubular, não estando presentes na urina. A presença de proteínas na urina deve ser avaliada em relação à densidade urinária e do sedimento, associado a achados clínicos. Ela é marcadora de dano glomerular e um dos principais sinais de progressão da insuficiência renal. A proteinúria pode ser pré-renal, renal e pós renal.

Proteinúria pré-renal: pode estar associada a perda glomerular de proteínas de baixo peso molecular. Causas: febre, hiperproteinemia, convulsões, exercício muscular intenso, extremos de frio ou calor.

Proteinúria renal: ocorre quando os rins perdem a capacidade de filtração devido alteração de permeabilidade capilar. Está acompanhada de baixa densidade e azotemia. Causas: doenças glomerulares e tubulares.

Proteinúria pós-renal: geralmente acompanhada de eritrócitos, leucócitos e células epiteliais do trato urinário inferior no sedimento e ausência de cilindros. A densidade encontra-se dentro dos valores fisiológicos. Causas: cistites, vaginites e uretrites. Sinais: disúria, polaquiúria e estrangúria.

Sangue oculto: consiste na presença de hemácias, hemoglobina ou mioglobina, não sendo aparente na urina fisiológica, indicando dano nos néfrons. Causas: infecções, neoplasias, lise eritrocitária, distúrbios musculares graves, doença inflamatória ou idiopática.

Urobilinogênio: uma pequena quantidade de urobilinogênio é excretado pela urina. A ausência ou diminuição do urobilinogênio urinário está relacionado a distúrbios intestinais de reabsorção (diarreia), enquanto o aumento reflete dano hepático obstrutivo, hepatite por incapacidade funcional de remoção do urobilinogênio da circulação, cirrose hepática e icterícia hemolítica.

 

EXAME MICROSCÓPICO DO SEDIMENTO NA URINÁLISE

Na urinálise o exame do sedimento é efetuado através de centrifugação. Deve ser interpretado de acordo com o método de coleta, exame químico e físico da urina. Sua avaliação auxilia a verificar a causa de turbidez aumentada. O sedimento pode ser constituído por células epiteliais de descamação, hemácias e leucócitos, cristais, cilindros, bactérias, fungos e outros achados.

Bactérias: apesar de ser comumente encontradas em amostras de urina, uma grande quantidade de bactérias sugere infecção bacteriana em algum ponto do trato urinário, especialmente quando associada a outros sinais de inflamação como piúria, hematúria e proteinúria, podendo indicar contaminação ou inflamação. Em caso de suspeita de infecção do trato urinário inferior é necessário realizar cultura bacteriana. A presença de qualquer organismo em amostras coletadas por cistocentese deve ser considerada significativa.

Células epiteliais: normal quando estão ausentes ou têm discreta presença. Quando em quantidade elevada (>5 células/campo) podem indicar irritação ou inflamação da bexiga. As células podem ser diferenciadas quanto sua morfologia e determinam o local da lesão.

Cilindros: representam moldes dos túbulos onde são formados. Um aumento na concentração dos cilindros pode indicar uma doença renal, mas não necessariamente uma falha renal. Fatores que favorecem a formação: baixo fluxo urinário, baixo pH e alta concentração de sais. Tipos de cilindros: proteicos (produzidos na alça de Henle), hialinos e granulosos (indicativo de doença tubular aguda), eritrocitários ou leucocitários (indicativo de inflamação ou hemorragia), largos (indicativo de insuficiência renal crônica), granular e céreo.

Cristais: produtos da alimentação do animal tem sua formação influenciada pelo pH, densidade, presença de inibidores ou promotores de cristais. Grande quantidade de cristais pode indicar urolitíases. A presença destes é relevante em animais com histórico de urolitíases. Cristais de cistina, tirosina ou leucina, são encontrados em alterações no metabolismo de proteínas e doenças hepáticas. Cristais de bilirrubina e biurato de amônio são encontrados em doenças hepáticas obstrutivas.

Eritrócitos e leucócitos: seu achado é normal quando na quantidade de 1 a 2/campo de observação no microscópio.

Hematúria: quando superior a 5/campo. Causas: dano glomerular, tumores no trato urinário, traumas, lesão causada por cálculos urinários, infarte renal, necrose tubular aguda, infecções e inflamações no trato urinário, traumas, infarto renal, parasitas, intoxicação, distúrbios hemostáticos, estro, pós-parto, nefrotoxinas e stress físico.

Leucocitúria: quando maior que 5/campo. Causas: inflamações renais (nefrite, glomerulonefrite, pielonefrite), inflamações do trato urinário inferior (uretrite, cistite) e inflamações do trato genital (vaginite, prostatite e metrite).

Fungos: a presença de leveduras podem ser contaminantes ou representar uma infecção fúngica verdadeira.

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Autora: Iolanda Cândido

 

Fonte:

http://www.uece.br/cienciaanimal/dmdocuments/Comunicacao1.2005.1.pdf

https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wp-content/uploads/2013/05/patol_clin.pdf

https://www.ufrgs.br/lacvet/restrito/pdf/magnus_urinalise.pdf

http://faef.revista.inf.br/imagens_arquivos/arquivos_destaque/aDVb4JqrjIFu5yG_2013-6-13-15-11-8.pdf

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